Das filhas da Ana Paula Arósio na novela Ciranda de Pedra, a mais doce certamente é aquela que também é filha do Marcelo Antony. Parece haver consenso sobre isso. E olhem que a concorrência ali é dura: a novela é absolutamente adocicada. E é minha novela favorita hoje.
Mas não há consenso sobre o que significa para uma pessoa ser doce.
No post anterior disse que a Gabrielle Anwar é, nos dois filmes que ali listei (Perfume de Mulher e Mergulho na Paixão), tão doce que deveria ser proibida para diabéticos. As outras atrizes que ali menciono (Meg Ryan, Claire Forlani, Rachel Adams) são todas incrivelmente doces nos seus papéis naqueles filmes.
Mas no que consiste a sua doçura? Difícil de dizer. Mas a doçura é quase impossível de não reconhecer.
Já fui chamado de duro, seco, insensível, até desumano. Mas sei que consigo, de vez em quando, ser doce. No entanto, confesso que não consigo direito identificar o locus da minha doçuram quando consigo ser doce. Estaria no olhar? No sorriso? No jeito de tratar? Nas frases ditas? Na leveza e delicadeza do toque? Num mix de tudo isso?
Em A Insustentável Leveza do Ser, filme baseado no livro de Milan Kundera, Juliette Binoche, linda como sempre, consegue ser doce. Também é doce em Chocolate (como não poderia ser, num filme com esse nome?) — mas a doçura é diferente. A primeira é uma doçura sensual, como a doçura erotizante do doce de leite, ou do leite condensado, ou do licor Grand Manier ou Cointreau. A a outra é uma doçura mais leve, quase como a doçura de um adoçante — ou o doce extremamente leve de uma água aromatizada ou do refrigerante H20. A gente sente a diferença, mas tem dificuldade de definir no que exatamente ela consiste.
Em Zen e a Manutenção da Motocicleta Robert Pirsig pergunta, através do personagem principal, o que é qualidade no pensamento e na sua expressão. No fundo, ele sabe e reconhece. Mas, como o resto de nós, tem dificuldade de definir. Como é que um professor de redação sabe que um trabalho merece 8,5 e o outro 8,75?
É difícil dar notas numéricas a coisas como a qualidade de um pensamento ou de sua expressão, a doçura de alguém, ou a intensidade ou profundidade de um sentimento, como a amizade ou o amor.
Mas, no fundo, a gente sabe, reconhece e consegue comparar.
Em Salto, 26 de Julho de 2008