25 de Agosto é Dia do Soldado – com homenagem para o Duque de Caxias. Mas é também o dia em que Jânio da Silva Quadros renunciou à Presidência do Brasil em 1961. Começaram aí as escaramuças que, no devido tempo, um pouco mais de dois anos e meio depois, levaram ao Golpe Militar de 1964 e aos vinte anos de ditadura.
Getúlio, em 24 de Agosto de 1954, deixou uma Carta Testamento. Jânio, sete anos e um dia depois, deixou uma Carta Renúncia. É este o texto dela.
"Fui vencido pela reação e assim deixo o governo. Nestes sete meses cumpri o meu dever. Tenho-o cumprido dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções, nem rancores. Mas baldaram-se os meus esforços para conduzir esta nação, que pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, a única que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo.
Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou de indivíduos, inclusive do exterior. Sinto-me, porém, esmagado. Forças terríveis levantam-se contra mim e me intrigam ou infamam, até com a desculpa de colaboração.
Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranqüilidade, ora quebradas, indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo que não manteria a própria paz pública.
Encerro, assim, com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes, para os operários, para a grande família do Brasil, esta página da minha vida e da vida nacional. A mim não falta a coragem da renúncia.
Saio com um agradecimento e um apelo. O agradecimento é aos companheiros que comigo lutaram e me sustentaram dentro e fora do governo e, de forma especial, às Forças Armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nesta oportunidade. O apelo é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios, para todos e de todos para cada um.
Somente assim seremos dignos deste país e do mundo. Somente assim seremos dignos de nossa herança e da nossa predestinação cristã. Retorno agora ao meu trabalho de advogado e professor. Trabalharemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria."
Brasília, 25 de agosto de 1961.
Jânio Quadros"
Na época da eleição em 1960 do Jânio eu tinha dezessete anos e, portanto, não podia votar ainda. Mas torci por ele e fiquei contente com sua vitória. Não achei nenhuma graça nos seu curto governo (menos de sete de meses: 31/1/61 a 25/8/61), entretanto. No plano doméstico, ele focou sua energia em questiúnculas sem importância, verdadeiros factóides: a proibição do uso de biquini nos concursos de miss televisionados, de brigas de galo, do uso de lança perfume, coisas desse tipo. Tentou regulamentar o carteado. No plano externo, reatou relações diplomáticas comerciais com a União Soviética e com a China Comunista, esta então ainda dominada com mão de ferro pelo fascínora Mao Tse Tung. Pior ainda, dias antes de renunciar condecorou com a Grã Cruz da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul ninguém menos do que Che Guevara, outro fascínora, que só não matou tantos quanto Mao Tse Tung porque não chegou a ter tanto poder. A condecoração de Che Guevara criou condições para aqueles que desejam desestabilizar o seu governo e, dias depois, ele se viu na necessidade de renunciar.
Conheci Jânio Quadros pessoalmente quando ele era Prefeito de São Paulo. Deu-me uma grande foto dele autografada. Apesar do governo chinfrim e da renúncia, continuei gostando dele até o fim. Torci para ele contra Mário Covas quando se candidatou a Prefeito de São Paulo, embora mais uma vez não tivesse votado nele por não ser eleitor na Capital. Guardo com carinho a foto que ele me deu e outra, a foto oficial de quando tomou posse como Governador de São Paulo em 1956, foto essa que, por vias complicadas e tortuosas, me chegou às mãos.
Em Salto, 25 de Agosto de 2008.