Tenho enorme receio de que o longo reinado do incomparável café de coador esteja chegando ao fim – vítima, de um lado da tecnologia, de outro lado da diversidade dos gostos e das preferências (que, hoje, chega às raias da frescura).
No passado, não havia grande diversidade. A gente chegava a um bar ou a uma padaria e pedia um cafezinho – e não havia o que discutir. Cafezinho era cafezinho, de coador, já com açúcar (em geral bastante), sem leite (naturalmente). Só se pedia uma média ou um pingado de manhã, na padaria, junto com um pãozinho com manteiga. A média vinha na xícara, o pingado no copo. A média em geral era mais clara do que o pingado – que, naturalmente, tinha mais café. Mas, fora disso, era cafezinho, ou cafezinho. Nada de frescura.
Agora, até em bares chinfrins há as benditas máquinas que fazem café expresso, com ou sem leite, com ou sem espuminha, carioquinha ou canelinha, sempre sem açúcar, que pode ser adoçado com açúcar, açúcar light, açúcar mascavo, ou os adoçantes Zero-Cal, Finn, Assugrin, Adocyl, Doce Menor, Gold, etc. Em coffeeshops (que, agora, até os McDonald’s têm) pode-se optar por um capuccino (ou frappuccino), um café bombom, um café baunilha, café caribe (tem leite condensado), ou, então, por um americano, um latte, um mocha, um machiatto, ou, ainda, por um café com licor (em cujo caso se pode optar por Amaretto, Amarula, Baileys, etc.), ou, em caso extremo, por um café gelado (tall, naturalmente). E sempre se pode tomar um café descafeinado – que sempre me deu a impressão de ser um café sem café.
Só Deus sabe onde vai parar essa diversidade.
Acho tudo isso frescura multiculturalista. Fico tentado a atribuir essa frescura multiculturalista à esquerda Pierre Cardin – a esquerda bem vestida (donde o Pierre Cardin), chique, e esnobemente culta, pleine de finesse, que tem apartamento no 16e. arrondissement em Paris… (Aquela esquerda a que o Lulla nunca vai poder aspirar).
Eu, por mim, gosto é de cafézinho de coador. Quentinho. Quando é de manhã, na padaria, um pingado, em copo grande (tipo copo de requeijão), com o café já vindo adoçado. E um pãozinho com manteiga na canoa (sem miolo – para não engordar muito) e sem ir à chapa (para não perder a crocância), ao qual eu infalivelmente acrescento sal (porque a manteiga, por mais salgada que seja, nunca é suficientemente salgada para mim).
O resto é para quem não tem o que fazer. Menu de café é, para mim, o fim da picada.
Abandonei os restaurantes Frango Assado na beira das estradas por duas razões. Primeiro, não vendem mais café de coador. Segundo, para o lanchinho do meio do dia, não vendem mais empada de frango (apesar de serem uma loja de frango). Só empada de algo que de frango passa longe misturado com palmito e com catupiry. Quem inventou isso que vá chupar prego.
Em São Paulo, 16 de Março de 2010
O café de coador continua, voce só precisa mencionar que quer café de coador, e não expresso.Gosto mais do de coador também. A maioria das padarias ainda mantem o café de coador.