“O Mal a Evitar”

Impecável o Editorial do Estadão.

Fui colega de José Serra por muitos anos na UNICAMP. Nunca foi simpático. Trabalhei para ele no início do mandato dele no governo do Estado de São Paulo, em 2007. Apesar disso, continuei a acha-lo, no plano pessoal, chato, irritante mesmo, cheio de manias. Mas não tenho dúvida de que é o candidato mais honesto, mais íntegro, mais capaz e mais preparado para assumir o governo brasileiro no próximo ano. As mulheres que pretendem votar nelas que me desculpem, mas nem a Marina nem muito menos Dilma tem um décimo da competência e da capacidade de José Serra – para não falar em sua experiência. A Marina pode ter a mesma honestidade e integridade, mas não tem a competência, a capacidade e a experiência executiva de José Serra.

Por isso, endosso o Editorial do Estadão, no seu apoio a José Serra e nas suas críticas que faz a Lulla.

Se alguém tinha alguma dúvida quanto ao despreparo de Lulla para o exercício da Presidência da República, o último ano a removeu. Ele provou, além de qualquer dúvida, para quem quer ver, que não tem capacidade sequer para entender a dignidade do cargo que ocupa e pelo menos cumprir a liturgia da função que exerce. Comporta-se, nessas eleições, como cabo eleitoral barato de uma candidata que ele impôs, como porta-bandeira de um partido corrupto, que não se vexa de fazer seus trambiques e tramóias – ou suas maracutaias — na própria ante-sala da Presidência, no Palácio do Planalto, diante das barbas, certamente mal-cheirosas (porque ultimamente ele vive babando), do Presidente.

A se confirmarem os resultados das pesquisas, que Deus nos ajude. Vamos precisar. Nunca antes nesse país precisamos tanto. 

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O Estado de S. Paulo

26 de setembro de 2010

Editorial: O mal a evitar

A acusação do presidente da República de que a Imprensa “se comporta como um partido político” é obviamente extensiva a este jornal. Lula, que tem o mau hábito de perder a compostura quando é contrariado, tem também todo o direito de não estar gostando da cobertura que o Estado, como quase todos os órgãos de imprensa, tem dado à escandalosa deterioração moral do governo que preside. E muito menos lhe serão agradáveis as opiniões sobre esse assunto diariamente manifestadas nesta página editorial. Mas ele está enganado. Há uma enorme diferença entre “se comportar como um partido político” e tomar partido numa disputa eleitoral em que estão em jogo valores essenciais ao aprimoramento se não à própria sobrevivência da democracia neste país.

Com todo o peso da responsabilidade à qual nunca se subtraiu em 135 anos de lutas, o Estado apoia a candidatura de José Serra à Presidência da República, e não apenas pelos méritos do candidato, por seu currículo exemplar de homem público e pelo que ele pode representar para a recondução do País ao desenvolvimento econômico e social pautado por valores éticos. O apoio deve-se também à convicção de que o candidato Serra é o que tem melhor possibilidade de evitar um grande mal para o País.

Efetivamente, não bastasse o embuste do “nunca antes”, agora o dono do PT passou a investir pesado na empulhação de que a Imprensa denuncia a corrupção que degrada seu governo por motivos partidários. O presidente Lula tem, como se vê, outro mau hábito: julgar os outros por si. Quem age em função de interesse partidário é quem se transformou de presidente de todos os brasileiros em chefe de uma facção que tanto mais sectária se torna quanto mais se apaixona pelo poder. É quem é o responsável pela invenção de uma candidata para representá-lo no pleito presidencial e, se eleita, segurar o lugar do chefão e garantir o bem-estar da companheirada. É sobre essa perspectiva tão grave e ameaçadora que os eleitores precisam refletir. O que estará em jogo, no dia 3 de outubro, não é apenas a continuidade de um projeto de crescimento econômico com a distribuição de dividendos sociais. Isso todos os candidatos prometem e têm condições de fazer. O que o eleitor decidirá de mais importante é se deixará a máquina do Estado nas mãos de quem trata o governo e o seu partido como se fossem uma coisa só, submetendo o interesse coletivo aos interesses de sua facção.

Não precisava ser assim. Luiz Inácio Lula da Silva está chegando ao final de seus dois mandatos com níveis de popularidade sem precedentes, alavancados por realizações das quais ele e todos os brasileiros podem se orgulhar, tanto no prosseguimento e aceleração da ingente tarefa – iniciada nos governos de Itamar Franco e Fernando Henrique – de promover o desenvolvimento econômico quanto na ampliação dos programas que têm permitido a incorporação de milhões de brasileiros a condições materiais de vida minimamente compatíveis com as exigências da dignidade humana. Sob esses aspectos o Brasil evoluiu e é hoje, sem sombra de dúvida, um país melhor. Mas essa é uma obra incompleta. Pior, uma construção que se desenvolveu paralelamente a tentativas quase sempre bem-sucedidas de desconstrução de um edifício institucional democrático historicamente frágil no Brasil, mas indispensável para a consolidação, em qualquer parte, de qualquer processo de desenvolvimento de que o homem seja sujeito e não mero objeto.

Se a política é a arte de aliar meios a fins, Lula e seu entorno primam pela escolha dos piores meios para atingir seu fim precípuo: manter-se no poder. Para isso vale tudo: alianças espúrias, corrupção dos agentes políticos, tráfico de influência, mistificação e, inclusive, o solapamento das instituições sobre as quais repousa a democracia – a começar pelo Congresso. E o que dizer da postura nada edificante de um chefe de Estado que despreza a liturgia que sua investidura exige e se entrega descontroladamente ao desmando e à autoglorificação? Este é o “cara”. Esta é a mentalidade que hipnotiza os brasileiros. Este é o grande mau exemplo que permite a qualquer um se perguntar: “Se ele pode ignorar as instituições e atropelar as leis, por que não eu?” Este é o mal a evitar.

Texto publicado na seção “Notas e Informações” da edição de 26/09/2010

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Em 27 de Setembro de 2010

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Eta país complicado…

Estou no Aeroporto Luís Eduardo Magalhães, em Salvador. Cheguei aqui um pouquinho antes do meio dia e tenho cinco horas de espera para voltar para São Paulo. Estou com meu computador e meu Modem 3G Claro. Mas a bateria de meu computador não dura cinco horas. Na verdade, nem quatro. Fui procurar um lugar com tomada em que pudesse me sentar, ainda que pagando para comer ou beber alguma coisa. Na Praça de Alimentação (há uma aqui) existem algumas tomadas, mas todas tomadas (desculpem o trocadilho) por gente que não parece que vai sair do lugar antes de amanhã. Acabei parando num lugar chamado Conexão Café, onde comi duas empadas e tomei uma cerveja – mas sem tomada. Meu computador indica que minha bateria vai durar 1h57m. São 12h48. Isso significa que, dentro de duas horas, estarei sem computador.

Quando é que as construtoras de aeroportos vão se dar conta de que quase todo mundo hoje viaja com computador, celular, DVD Player, Video Game, etc. e que esses dispositivos precisam ser carregados, especialmente diante das esperas homéricas em nossas carentes aeroportos???

Arre… Queria morar em um país civilizado, onde aeroportos tivessem tomadas à vontade, onde qualquer gaiato não pudesse olhar as declarações de Imposto de Renda da gente… E onde governantes e governados não achassem que estão vivendo no Éden antes da queda…

Em Salvador, 3 de Setembro de 2010

Taiwan, Estados Unidos e Brasil

Um tempo atrás tive de tirar um visto para Taiwan enquanto estava nos Estados Unidos. Fui ao Consulado de Taiwan em Chicago. O visto ficava 18 dólares para entrega em três dias e 36 dólares para entrega em três horas.

Hoje fui tirar o mesmo visto no Consulado de Taiwan aqui no Brasil: 115 reais para entrega em cinco dias, 175 reais (CEM DÓLARES) para entrega em 24 horas.

Pergunta:  Por quê?

Fiz a pergunta à senhora que atendia… Ela me disse que Taiwan cobra dos cidadãos de um país um valor equivalente àquele que aquele país cobra dos cidadãos de Taiwan.

Justo, não é?

Mas pagamos quase três vezes mais porque o governo brasileiro é faminto por dinheiro.

Em Campinas, 20 de Abril de 2010

A letter to Barack Obama and the American People from Jon Voight

Corajosa a carta de Jon Voight, o ator e pai de Angelina Jolie (sogro do Brad Pitt, para quem prefere…), concitando o povo americano a resistir à tentativa de socialização da medicina nos Estados Unidos. Atrás deste, virão outros projetos. E corajosa a sua manifestação em Op-Ed em The Washington Times acerca da educação (tema que levantei aqui recentemente).

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A Letter to President Obama and the American People

Jon Voight

"In one year, the American people are witnessing the greatest lie that is cleverly orchestrated by President Obama and his whole administration. The lie is a potent aggression that feeds the needs of people who either have not educated themselves enough to understand the assault upon us all or are the very poor and needy who live to be taken care of.

President Obama feeds these people poison, giving them the idea that they are entitled to take from the wealthier who have lived and worked in a democracy that understands that capitalism is the only truth that keeps a nation healthy and fed. Now the lie goes very deep and President Obama has been cleverly trained in the Alinsky method.

It would be very important that every American knows what that method is. It is a socialistic, Marxist teaching and with it, little by little, he rapes this nation, taking down our defenses, making new language for the Islamic extremists. The world that looked up to us as a symbol of hope and prosperity now wonders what will become of the entire world if America is losing its power. The American people who understand exactly what is taking place have come together in the thousands, vowing to try to stay together as a unit of love and freedom for all men and women, from all walks of life, shivering to think that this once great nation will be a third world country.

This will be the first president to ever weaken the United States of America. President Obama uses his aggression and arrogance for his own agenda, against the will of the American people when he should be using his will and aggression against our enemies. Every loving American for peace and truth and the security of our nation must come out and join the Tea Parties in their states. The opposition will continue their tactics; they will lie and plant their own bullies amongst us. Everyone must pay close attention to who stands next to them. We can weed out the liars and agitators.

Let us all stay in Gods light. Let no man put us asunder. We can and we will prevail.

God bless us all!"

~Jon Voight, April 10th, 2010

(Transcrita de http://www.mikehuckabee.com/index.cfm?fa=News.View&News_id=81ab6429-884d-44fc-b215-057032cbf4d2)

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“My Concerns for America”

Jon Voight

Op-Ed, The Washington Times

We, as parents, are well aware of the importance of our teachers who teach and program our children. We also know how important it is for our children to play with good-thinking children growing up.

Sen. Barack Obama has grown up with the teaching of very angry, militant white and black people: the Rev. Jeremiah Wright, Louis Farrakhan, William Ayers and Rev. Michael Pfleger. We cannot say we are not affected by teachers who are militant and angry. We know too well that we become like them, and Mr. Obama will run this country in their mindset.

The Democratic Party, in its quest for power, has managed a propaganda campaign with subliminal messages, creating a God-like figure in a man who falls short in every way. It seems to me that if Mr. Obama wins the presidential election, then Messrs. Farrakhan, Wright, Ayers and Pfleger will gain power for their need to demoralize this country and help create a socialist America.

The Democrats have targeted young people, knowing how easy it is to bring forth whatever is needed to program their minds. I know this process well. I was caught up in the hysteria during the Vietnam era, which was brought about through Marxist propaganda underlying the so-called peace movement. The radicals of that era were successful in giving the communists power to bring forth the killing fields and slaughter 2.5 million people in Cambodia and South Vietnam. Did they stop the war, or did they bring the war to those innocent people? In the end, they turned their backs on all the horror and suffering they helped create and walked away.

Those same leaders who were in the streets in the ’60s are very powerful today in their work to bring down the Iraq war and to attack our president, and they have found their way into our schools. William Ayers is a good example of that.

Thank God, today, we have a strong generation of young soldiers who know exactly who they are and what they must do to protect our freedom and our democracy. And we have the leadership of Gen. David Petraeus, who has brought hope and stability to Iraq and prevented the terrorists from establishing a base in that country. Our soldiers are lifting us to an example of patriotism at a time when we’ve almost forgotten who we are and what is at stake.

If Mr. Obama had his way, he would have pulled our troops from Iraq years ago and initiated an unprecedented bloodbath, turning over that country to the barbarianism of our enemies. With what he has openly stated about his plans for our military, and his lack of understanding about the true nature of our enemies, there’s not a cell in my body that can accept the idea that Mr. Obama can keep us safe from the terrorists around the world, and from Iran, which is making great strides toward getting the atomic bomb. And while a misleading portrait of Mr. Obama is being perpetrated by a media controlled by the Democrats, the Obama camp has sent out people to attack the greatness of Sen. John McCain, whose suffering and courage in a Hanoi prison camp is an American legend.

Gen. Wesley Clark, who himself has shame upon him, having been relieved of his command, has done their bidding and become a lying fool in his need to demean a fellow soldier and a true hero.

This is a perilous time, and more than ever, the world needs a united and strong America. If, God forbid, we live to see Mr. Obama president, we will live through a socialist era that America has not seen before, and our country will be weakened in every way.

Jon Voight is an Academy Award-winning actor who is well-known for his h
umanitarian work.

(Transcrito de http://www.washingtontimes.com/news/2008/jul/28/voight/)

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Em São Paulo, 11 de Abril de 2010

“Chega de saudade”

Não sou pessedebista. Na verdade, não sou afiliado ou simpatizante de partido político nenhum. Mas considero o Editorial da Folha de hoje perfeito. Ele está transcrito adiante. Endosso-o em sua totalidade.

Só acrescento o registro que boa parte das mudanças que resultaram na liberalização econômica do Brasil, e colocaram o Brasil na trilha do desenvolvimento econômico, foram feitas por Fernando Collor de Mello. Até o seu governo nossos cartões de crédito tinham uma tarja que dizia “Valid only in Brazil”. Foi ele que chamou os carros feitos pelas quatro montadoras que tinham o monopólio (na realidade, um oligopólio) da fabricação de automóveis no Brasil de carroças – e abriu o mercado para outras montadoras, criando um clima de concorrência do qual nos beneficiamos até hoje.

Itamar Franco deu continuidade à obra de Collor – e teve o mérito de nomear Fernando Henrique Cardoso Ministro da Economia. Foi FHC, como ministro de Itamar, que implantou o Plano Real.

Lulla se beneficiou de tudo isso – que chamou de “herança maldita”.

Crédito a quem crédito é devido.

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Folha de S. Paulo
07 de Março de 2010

Editoriais
editoriais@uol.com.br
Chega de saudade

A candidata oficial erra ao voltar-se para o passado com o intuito de forjar uma revanche na disputa particular de FHC e Lula

EM SEU PRIMEIRO discurso depois de deixar a Casa Civil, a candidata Dilma Rousseff insistiu na tentativa de comparar o atual governo com o anterior.

Não se sabe o que pesa mais nessa estratégia enviesada, se a obsessão íntima do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de se medir com o antecessor Fernando Henrique Cardoso ou a percepção de que é mais vantajoso para a representante da situação transformar eleições que decidem o futuro do país em avaliação de fatos passados.

Não é demais lembrar que um brasileiro com 18 anos completados em 2010 comemorava 10 ao término do governo FHC – e era uma criança de dois anos quando o sociólogo tucano assumiu.

Esse hipotético cidadão não terá idade para lembrar em que país se vivia no início da década de 90. Mas, se procurar informações, saberá que coube a FHC, na sequência do impeachment de Fernando Collor, e ainda no governo de Itamar Franco, lançar um plano -depois de várias tentativas frustradas- capaz de superar o perverso ciclo hiperinflacionário que havia anos dilapidava a economia popular e impedia o desenvolvimento do país.

Se pretende incursionar pelo passado, poderia a candidata lembrar a seus potenciais eleitores que o Partido dos Trabalhadores negou sustentação ao presidente Itamar Franco e bombardeou o Plano Real. Ou seja, opôs-se de maneira pueril e ideológica a uma das mais notáveis conquistas econômicas da história moderna do país, que propiciou aos brasileiros pobres benefícios inestimáveis, sob a forma de imediato aumento do poder aquisitivo e inédito acesso ao sistema bancário.

Sabe bem a ex-ministra que se alguém nesses anos mudou de pele foi antes o PT do que o PSDB. O que terá sido a famosa "Carta aos Brasileiros" senão uma providencial e pública troca de vestimenta ideológica do candidato Lula -que, eleito, sob aplausos do mundo financeiro, indicou um tucano para o Banco Central (agora no PMDB) e um ex-trotskista com plumagem neoliberal para a Fazenda?

É um exercício vão buscar comparações e escolhas plebiscitárias entre gestões que se encadeiam no tempo. Os avanços e problemas de uma transformam-se em acúmulo ou em fatos acabados na outra. Ou será que faz sentido questionar como teria sido a gestão lulista se tivesse de formular um plano para vencer a hiperinflação, precisasse sanear instituições financeiras públicas e se visse obrigada a estancar uma crise sistêmica dos bancos privados nacionais?

O Brasil precisa pensar e agir com olhos no futuro. Nada tem a ganhar com a tentativa da candidatura governista de forjar uma revanche de disputas pretéritas. Se o presidente Lula não venceu a contenda com Fernando Henrique Cardoso em 1994 não será agora que o fará -pelo simples motivo de que nenhum dos dois é candidato. O governo que se encerra neste ano teve méritos inegáveis, mas muitos deles, é forçoso reconhecer, nasceram de sementes plantadas no passado.

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Em São Paulo, 7 de Abril de 2010
[Obrigado a Gilmar Rocha que, no Facebook, corrigiu dois errinhos meus. Um na data,que eu havia colocado 7 de Março de 2010, e outro no "monopólio" de quatro empresas que, na realidade, é um oligopólio].

Calligaris, me desculpe, mas você está muito errado…

Gosto de ler Contardo Calligaris. Raramente discordo drasticamente do que ele escreve ou diz (participei com ele de um congresso em Bento Gonçalves algum tempo atrás). Mas discordo, e veementemente, do artigo que ele publicou na Folha de S. Paulo de ontem, 1 de Abril de 2010, sobre “pedófilos, celibatários e infalíveis”.

O artigo de Galligaris é uma crítica àqueles que, como eu, acham que o celibato imposto aos sacerdotes católicos romanos tem muito (embora não tudo) que ver com os vários surtos de pedofilia homossexual que acometem os padres.

Não acho que o celibato clerical seja a única causa da pedofilia homossexual católica. Em minha opinião, ele faz parte de um conjunto de causas que me parece impossível negar.

Em dois artigos anteriores, aqui neste blog, toquei nesse assunto.

Neles argumentei em favor de minha conjectura (em três partes) acerca das causas principais do número relativamente elevado de padres que se envolvem com pedofilia homossexual. 

1) O seminarista, futuro padre, é desde cedo doutrinado a ver na mulher a fonte número um do pecado. Como ele vai ser celibatário, e sabe disso, a mulher é a tentação que ele deve evitar a todo custo. A mulher é, para ele, símbolo de tentação: a Eva que, por influência da serpente, induziu Adão a pecar.

2) A Igreja trancafia o futuro padre, em muitos casos desde cedo, em seminários, onde ele fica segregado de mulheres: só vê guris mais ou menos da sua idade – e, naturalmete, os professores (todos homens). Internatos unissex parece que foram bolados para gerar, nos adolescentes, interesse pelo mesmo sexo (principalmente quando o interesse pelo sexo oposto é não só proibido, mas demonizado).

3) Quando vai exercer o sacerdócio, o padre acaba ficando rodeado de coroinhas, parecidos com os seus coleguinhas de seminário menor, que, agora, o admiram e olham para ele como figura de autoridade. E ele, por outro lado, pela sua doutrinação, é condicionado a fugir das mulheres, e pela sua formação em internato unissex, é condicionado a se interessar por meninos… Sendo figura de autoridade, não tem muita dificuldade em convencer os meninos de que sexo (em alguma modalidade) com o sacerdote é parte de seus deveres.

Essa combinação de fatores é fatal: ela acaba produzindo essa série aparentemente infindável de casos de pedofilia homossexual entre padres católicos. Não se trata, como já disse, de meros escândalos sexuais em relação aos quais se possa dizer: “Sou culpado, mas que igreja pode dizer que não é?” Trata-se de um fenômeno tipicamente católico que não adianta tentar generalizar.

Calligaris “ach[a] bizarro que o fim do celibato dos padres seja apresentado como remédio contra a pedofilia”.

Não é só o fim do celibato que é o remédio. Conforme propus no primeiro dos meus artigos sobre o assunto, a solução, evidentemente, é tripla: que a Igreja Católica acabe com o celibato clerical, acabe com a formação para o sacerdócio no confinamento de internatos unissex, e acabe com as figuras de coroinhas e outros meninos que ficam rodeando o padre na sacristia. 

E acabar com o celibato clerical não é apenas permitir que os padres se casem: é mudar drasticamente a visão que a Igreja Católica tem da mulher como uma Eva tentadora perpétua, contra as quais os padres devem se guardar. No fundo, a Igreja Católica tem uma visão perniciosa da mulher porque tem uma visão distorcida da sexualidade. Para ser considerada pura, Maria teve não só de conceber Jesus ainda virgem como precisou permanecer virgem perpetuamente (a despeito do fato de que o Novo Testamento fala claramente nos irmãos de Jesus). A pureza de Maria não poderia sobreviver, na visão católica, à realização, por ela, do ato sexual, ainda que de forma casta, dentro do casamento dela com José, e não por prazer, mas como dever, com a finalidade de procriar (crescer, multiplicar e encher a terra de gente). Como, para a Igreja Católica, o ato sexual só pode ter como finalidade a procriação, atos sexuais homossexuais, que não podem resultar em procriação, são aparentemente vistos como menos graves…

Calligaris se explica:

“Essa ideia [de que o celibato clerical tem que ver com os surtos de pedofilia homossexual] surge de uma visão hidráulica do desejo sexual, como se esse fosse um rio que, se for impedido de correr no seu leito natural, encontrará todo tipo de caminho torto e desviado. Por essa visão, na ausência de esposa, a libertinagem, não tendo para onde ir, transborda e acaba banhando (quem sabe, afogando) as crianças; portanto, os padres pedófilos não precisariam recorrer a meninos e meninas se dispusessem de uma mulher com quem saciar seus apetites.”

É simplista essa análise de Calligaris. Há muitos, acredito, padres católicos ou não, que resistem valentemente ao desejo sexual ou são capazes de o sublimar, sem precisar dar vazão a ele. Este, evidentemente, não é o caso dos padres pedófilos. Estes não controlam nem sublimam seu desejo sexual. Optam por realizá-lo. Tendo feito essa opção, têm de escolher (ainda que tacitamente) como realizá-lo.

a) Para casar normalmente, como todo mundo, o padre terá de abandonar o sacerdócio. Essa é uma opção difícil para a maior parte deles.

b) O padre pode arrumar uma companheira secreta, viver com ela maritalmente, ter seus filhos como se fosse um homem casado. Muitos fazem isso. A Igreja Católica felizmente faz vistas grossas. O Presidente do Paraguai foi bispo, teve uma série de companheiras e deixou uma penca de filhos. Até que se tornou presidente, tudo isso estava tranqüilamente preservado do público. Essa, para o padre que quer continuar padre, é, a meu ver, a mais sadia e a mais sensata das diversas opções. Mas, como se pode ver, ela tem seu ônus, que o Presidente do Paraguai está pagando. Companheiras regulares às vezes ficam grávidas, a Igreja é contra o aborto, elas têm a criança, e o “filho do padre” é sempre um estigmatizado – alem de requerer pensão alimentícia e outros cuidados.

c) Resta a opção pelo mesmo sexo. Sem dúvida há padres homossexuais, cujos parceiros são adultos (também padres ou não). Mas essa opção também tem seu ônus. Se a “mulher do padre” é estigmatizada, “o marido do padre” seria ainda mais… Sobram os meninos, os coroinhas… O fato de que o padre é autoridade, que ele pode exigir os serviços sexuais dos meninos como parte de seus deveres como coroinhas, e a vergonha natural dos meninos que torna difícil revelar o que está acontecendo, tudo isso contribui para que muitos padres apostem nessa forma de realizar sua sexualidade. Acham que ela vai permanecer secreta e, conseqüentemente, impune. Mas, como estamos vendo, uma vez que alguém abra a boca, outros se encorajam a fazê-lo, também, e temos um surto.

É isso. Sem rever a sua doutrina acerca da sexualidade, e, conseqüentemente, a visão de que o pecado original foi sexual e induzido pela mulher; sem rever a doutrina do nascimento virginal de Jesus e da virgindade perpétua de Maria; sem rever a doutrina do celibato clerical; sem rever o confinamento em internatos unissex como a forma ideal de preparar sacerdotes; sem rever a doutrina que impede a ordenação de mulheres e a participação das mulheres em posições importantes na alta hierarquia na Igreja, chegando até mesmo ao Papado, a Igreja Católica não vai conseguir resolver o seu problema de padres pedófilos homossexuais.

A Igreja tentou fazer vistas grossas a esse problema, como sempre fez em relação aos padres que possuem companheiras ou que geram filhos com paroquianas disponíveis. Mas o problema aqui é muito mais sério. Trata-se de um crime – cometido contra menores inocentes.

Discordo mais uma vez de Calligaris quando ele diz:

“Aos meus olhos, nesta história que não acaba, o escândalo maior talvez não seja o abuso das crianças, mas o comportamento oficial da igreja: de maneira consistente e repetida, ela parece colocar seu interesse institucional acima de qualquer consideração moral.”

O escândalo maior é o abuso de crianças, sim. A tentativa de colocar panos quentes sobre o problema afeta apenas a imagem da igreja. O abuso de crianças afeta as crianças também e principalmente.

Adiante, o artigo de Calligaris.

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0104201023.htm 

Folha de S. Paulo
1 de Abril de 2010

CONTARDO CALLIGARIS
Pedófilos, celibatários e infalíveis


Os padres pedófilos são minoria, mas a igreja como instituição trata fiéis como crianças


EM 2002, graças a uma série de artigos do "Boston Globe", estourou, nos EUA, o escândalo dos abusos sexuais de crianças por padres católicos. Desde então, uma onda de denúncias varre a Igreja Católica no mundo inteiro.

Última revelação, no "New York Times" da quinta passada: nos anos 1990, quando ele comandava a Congregação da Doutrina e da Fé, o atual papa, Bento 16, suspendeu o julgamento de um padre americano, acusado de molestar 200 meninos surdos, de cujos espíritos e almas, em princípio, ele devia cuidar.

Aos meus olhos, nesta história que não acaba, o escândalo maior talvez não seja o abuso das crianças, mas o comportamento oficial da igreja: de maneira consistente e repetida, ela parece colocar seu interesse institucional acima de qualquer consideração moral. Escândalo, mas sem surpresa alguma: em geral, o projeto dominante de qualquer instituição é o de durar para sempre.

Mas trégua: não escrevo esta coluna para me indignar. Prefiro contribuir ao debate do momento com duas observações, sugeridas pela psicopatologia e pela clínica.

1) Da conversa de botequim até o pronunciamento de um teólogo que admiro (Hans Küng, na Folha de 21 de março), os abusos sexuais de crianças por padres católicos reavivam as críticas contra o celibato dos padres.

Cuidado, não sou um defensor do celibato dos padres. Ao contrário, parece-me que a experiência de amar e conviver melhoraria a qualidade dos ministros da igreja, porque a tarefa de ser consorte ensina uma humildade que é difícil alcançar na solidão, seja ela orgulhosa e casta ou, então, envergonhada e masturbatória.

No entanto, acho bizarro que o fim do celibato dos padres seja apresentado como remédio contra a pedofilia.

Essa ideia surge de uma visão hidráulica do desejo sexual, como se esse fosse um rio que, se for impedido de correr no seu leito natural, encontrará todo tipo de caminho torto e desviado. Por essa visão, na ausência de esposa, a libertinagem, não tendo para onde ir, transborda e acaba banhando (quem sabe, afogando) as crianças; portanto, os padres pedófilos não precisariam recorrer a meninos e meninas se dispusessem de uma mulher com quem saciar seus apetites.

É raro que eu me expresse de maneira tão direta, mas é preciso dizer: essa ideia é uma estupidez. Fantasias e orientações sexuais nunca são o efeito de acumulação de energia sexual insatisfeita. Um pedófilo poderá, eventualmente, desejar uma mulher e casar com ela, mas o fato de cumprir, mesmo com afinco, o dever conjugal não o livrará das fantasias pedofílicas. Teremos, simplesmente, pedófilos casados, em vez de solteiros.

Não vejo o que ganharíamos com isso, mas vejo, isso sim, na própria proposta, um desprezo inacreditável pelas mulheres que se casariam para servir de válvulas de escape para a "depravação" dos seus maridos. Ninguém merece.

A quem propõe o casamento como solução para a pedofilia dos padres, uma sugestão: proponha um programa compulsório de transa diária com a boneca inflável do Geraldão. Será tão ineficiente quanto o casamento, mas, ao menos, as mulheres serão poupadas.

2) Não é exato dizer que pedófilo é quem gosta de "carne" jovem. Pois o que importa ao pedófilo, o que é crucial na fantasia, é induzir a vítima a aceitar algo que ela desconhece e não entende. A jovem idade da vítima é sobretudo garantia de sua inocência e ignorância, ou seja, do fato de que a vítima não entenderá o que lhe será feito.

Por exemplo, um dos padres denunciados em Boston, em 2002, explicou que seu prazer consistia não tanto em ser satisfeito oralmente por um menino quanto em convencer o menino de que essa era uma forma especial de santa comunhão, que ele, o padre, ensinava e administrava.

Em suma, o pedófilo encontra seu prazer iniciando os ignaros e exercendo sobre eles um poder pedagógico absoluto. Agora, considere o jeito como a Igreja Católica tratou seu rebanho, até ser forçada a reconhecer a culpa de alguns de seus ministros. Considere a prática recorrente de camuflar decisões administrativas em dogmas divinos, considere a repressão teológica em lugar do diálogo e ainda considere a doutrina da pretensa infalibilidade do pontífice. Pois bem, aparentemente, os padres pedófilos são pequena minoria, mas a igreja como instituição trata mesmo seus fiéis como criancinhas.

ccalligari@uol.com.br

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Em São Paulo, 2 de Abril de 2010

Vaticano tenta tapar o sol com a peneira

Há dias publiquei aqui o post “Pedofilia entre padres” (http://ec.spaces.live.com/blog/cns!511A711AD3EE09AA!3386.entry).

Ali argumentei em favor de minha conjetura (em três partes) acerca das causas principais desse número relativamente elevado de padres que se envolvem com pedofilia homossexual. 

1) O seminarista, futuro padre, é desde cedo doutrinado a ver na mulher a fonte número um do pecado. Como ele vai ser celibatário, e sabe disso, a mulher é a tentação que ele deve evitar a todo custo. A mulher é, para ele, símbolo de tentação.

2) A Igreja trancafia o futuro padre, em muitos casos desde cedo, em seminários, onde ele fica segregado de mulheres: só vê guris mais ou menos da sua idade – e, naturalmete, os professores (todos homens). Internatos unissex parece que foram bolados para gerar, nos adolescentes, interesse pelo mesmo sexo (principalmente quando o interesse no sexo oposto é proibido).

3) Quando vai exercer o sacerdócio, o padre acaba ficando rodeado de coroinhas, parecidos com os seus coleguinhas de seminário menor, que, agora, o admiram e olham para ele como figura de autoridade. E ele, por outro lado, pela sua doutrinação é condicionado a fugir das mulheres e pela sua formação em internato unissex foi condicionado a se interessar por meninos… Sendo figura de autoridade, não tem muita dificuldade em convencer os meninos de que sexo (em alguma modalidade) com o sacerdote é parte de seus deveres.

Essa combinação de fatores é fatal: ela acaba produzindo essa série aparentemente infindável de casos de pedofilia homossexual entre padres católicos. Não se trata, como já disse, de meros escândalos sexuais em relação aos quais se possa dizer: “Sou culpado, mas que igreja pode dizer que não é?” Trata-se de um fenômeno tipicamente católico que não adianta tentar generalizar.

O UOL Notícias – Últimas Notícias de hoje (29/3/2010) traz uma matéria mostrando que o Vaticano está tentando argumentar que o celibato clerical não tem nada com isso. A Igreja tenta, mais uma vez, tapar o sol com a peneira. Dizer é fácil – substanciar o que se diz com fatos e argumentos, entretanto, é outra coisa, e isso o Vaticano não faz.

Vide a matéria:

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http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2010/03/29/para-vaticano-celibato-nao-e-causa-de-abusos-sexuais.jhtm

29/03/2010 – 10h08

Para Vaticano celibato não é causa de abusos sexuais

O presidente do Conselho Pontifício para a Promoção dos Cristãos, o cardeal alemão Walter Kasper, declarou nesta segunda-feira que "o celibato não tem relação com os abusos sexuais de menores cometidos por padres", ao mesmo tempo que cada vez mais denúncias de pedofilia abalam a Igreja Católica da Europa.

O onda de escândalos de pedofilia que afeta o Velho Continente gerou um debate sobre as repercussões do celibato e da abstinência sexual nos sacerdotes, uma tradição milenar que o Vaticano defende de modo ferrenho.

"Todos os especialistas sustentam que a maioria dos abusos acontece dentro da família e não em meios religiosos", afirmou o cardeal alemão, um defensor do celibato, que para ele "não deve ser absolutamente abolido".

Kasper considera que abrir o debate sobre o celibato é "o abuso dos abusos e constitui uma instrumentalização dos casos de pedofilia".

"O celibato é respeitado na Igreja desde antes de virar uma regra canônica no século XI", recordou Kasper.

"Não é um dogma, sim uma antiga tradição que conserva intacta sua razão e não é necessária revisar esta legislação, nem modificar as coisas", destacou.

"É inoportuno abrir o tema neste momento, envenenado pelas polêmicas e os escândalos pelos abusos sexuais cometidos por padres e religiosos", acrescentou.

Apesar das posições intransigentes, alguns religiosos, entre eles o arcebispo de Viena, o cardeal Christoph Schoenborn, pediu recentemente à Igreja uma revisão do tema do celibato.

O cardeal italiano Carlo Maria Martini, renomado intelectual e que está entre os religiosos mais progressistas do colégio cardinalício, considera que "é preciso revisar a obrigação do celibato para os padres".

"Temos que encontrar novos caminhos", afirmou o cardeal Martini, arcebispo emérito de Milão, que não evita o debate sobre temas fundamentais.

"Assuntos profundos como a sexualidade devem ser revisados com as novas gerações, porque apenas um debate aberto pode devolver sua autoridade à Igreja", disse em uma entrevista à imprensa austríaca.

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Em São Paulo, 29 de Março de 2010

Pedofilia entre padres

Voltou ao noticiário, aparentemente com maior intensidade do que da última vez, a questão da pedofilia entre sacerdotes católicos romanos. Respingos dos escândalos andam  beirando até a família de Sua Santidade num colégio interno católico dirigido por um irmão do Papa na Alemanha. Li na VEJA da semana passada a história de um padre de 82 anos com seu coroinha de 20 – aqui no Brasil. A coisa está feia.

Fico me perguntando o seguinte: por que a quebra do voto de castidade dos sacerdotes católicos parece acontecer, em regra, com pessoas do mesmo sexo, e bem mais jovens – em alguns casos, meninos, mesmo? Pastores protestantes e sacerdotes de outras igrejas de vez em quando se envolvem escândalos sexuais – mas raramente o fazem com pessoas do sexo masculino e quase nunca com crianças. O que explica essa preferência dos sacerdotes católicos por meninos, muitos deles coroinhas?

Que fique claro: no caso dos sacerdotes católicos não se trata de mero “escândalo sexual” a ser punido com uma providência burocrático-administrativa, de nível meramente interno. Trata-se predominantemente de pedofilia, que é crime – e pedofilia homossexual. (O fato de ser homossexual não agrava o crime, mas nos ajuda a entender o fenômeno).

Tenho uma conjetura.

Em primeiro lugar, o seminarista, futuro padre, é desde cedo doutrinado a ver na mulher a fonte número um do pecado. Como ele vai ser celibatário, a mulher é a tentação que ele deve evitar a todo custo. A mulher é, para ele, o que a serpente foi para Eva, na história da queda. A doutrina do celibato clerical, assim, começa a afetar o futuro padre muito antes de ele efetivamente fazer os seus votos (dos quais o de castidade parece ser o mais difícil de cumprir).

Em segundo lugar, trancafiam o futuro padre, em muitos casos desde os dez anos (início da quinta série) em um Seminário Menor, onde ele fica segregado de mulheres: só vê guris mais ou menos da sua idade – e, naturalmete, os professores (todos homens). Internatos unissex parece que foram bolados para gerar, nos adolescentes, interesse pelo mesmo sexo. Numa época em que o instinto sexual está aflorando e se tornando a preocupação número um-dois-e-três do adolescente, ele é apartado da convivência com o sexo oposto e confinado à convivência com homopares. Acaba ficando fixado em menino. Sua curiosidade pelo sexo só pode ser satisfeita pelos colegas. Quando cresce, o desejo sexual não cresce com ele: continua fixado em meninos.

Em terceiro lugar, quando vai exercer o sacerdócio, o padre acaba ficando rodeado de coroinhas, parecidos com os seus coleguinhas de seminário menor, que, agora, o admiram e olham para ele como figura de autoridade. E ele, por outro lado, pela sua doutrinação é condicionado a fugir das mulheres e pela sua formação em internato unissex foi condicionado a se interessar por meninos… Sendo figura de autoridade, não tem muita dificuldade em convencer os meninos de que sexo (em alguma modalidade) com o sacerdote é parte de seus deveres. (O que mais pode levar um coroinha de vinte a se engajar em atividade sexual com um sacerdote de 82?)

Esse conjunto de fatores acaba produzindo essa série aparentemente infindável de casos de pedofilia homossexual entre padres católicos. Não se trata, como já disse, de meros escândalos sexuais em relação aos quais se possa dizer: “Sou culpado, mas que igreja pode dizer que não é?” Trata-se de um fenômeno tipicamente católico que não adianta tentar generalizar.

Se minha conjetura faz sentido, a solução, evidentemente, é tripla: que a Igreja Católica acabe com o celibato clerical, acabe com a formação para o sacerdócio no confinamento de internatos unissex, e acabe com as figuras de coroinhas e outros meninos que ficam rodeando o padre na sacristia. 

Estudei em um internato (protestante) durante meu curso Clássico. Mas não era unissex. Era misto. Nunca tive conhecimento de colegas que tivessem se interessado por colegas do mesmo sexo. A regra era que se interessassem pelas meninas. E se interessavam bastante.

Que fique claro que não considero o homossexualismo um pecado, muito menos um crime. Nada tenho contra quem faz a opção por exercer sua sexualidade com pessoas do mesmo sexo. Mas a pedofilia, sim, é crime. Crime que, no caso dos padres, é agravado pelo fato de o padre estar em posição de autoridade em relação aos meninos dos quais abusa. A Igreja Católica não pode continuar a tratar a pedofilia sacerdotal com a leniência de sempre: uma reprimanda, uma mudança de paróquia, etc. Não se trata de um pecadilho: trata-se de um crime muito sério.

O problema exige soluções mais drásticas. 

A seguir, um ponto de vista contrário, retirado da Folha de S. Paulo de hoje (23/3/2010). Deixo aos leitores a tarefa de julgar os méritos relativos da minha posição e da de João Pereira Coutinho (que parece ser um jornalista português que escreve para a Folha – vide http://www.jpcoutinho.com/).

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Folha de S. Paulo
23 de Março de 2010

JOÃO PEREIRA COUTINHO

Padres e pedófilos


O jornalismo preguiçoso deveria separar a histeria anticatólica da verdade criminal


ESTAMOS SEMPRE a aprender: vocês sabem como se diz "bastardo" em língua germânica? "Pfaffenkind." Ou, em tradução literal, "o filho do padre". As curiosidades não acabam aqui: ainda na Alemanha protestante, a expressão coloquial para designar a frequência de bordéis era "agir como um bispo".

É claro que não precisamos viajar até a Alemanha para encontrar esse glorioso imaginário em que membros do clero (católico) se entregam à lascívia. De Chaucer a Boccaccio, passando pelos textos centrais do Iluminismo continental (a "Religiosa", de Diderot; o "Émile", de Rousseau; as múltiplas mediocridades de Sade), o padre não é simplesmente o pastor espiritual em missão evangélica.

O padre é o "fornicador" incansável, sempre disposto a atacar donzelas virgens ou mulheres casadas. Sem falar do resto: o lesbianismo das freiras, a sodomia entre monges e a tortura física por que passa o seminarista casto, que se fustiga com prazer masoquista para compensar uma dolorosa ausência de fêmea (ou de macho).

Sejam sinceros: quando existem escândalos sexuais na Igreja Católica, eles não são apenas escândalos sexuais pontuais e localizados. Esses escândalos, que existem em todo o lado (e em todas as denominações religiosas), bebem diretamente no patrimônio literário e anticatólico do Ocidente.

O caso é agravado pela arcana questão do celibato. No mundo moderno e hipersexualizado em que vivemos, o celibato não é visto como uma opção pessoal (e espiritual) legítima e respeitável. O celibato só pode ser tara; só pode ser um convite ao desvio; só pode ser pedofilia. Esses saltos lógicos são tão comuns que já nem horrorizam ninguém.

Ou horrorizam? Philip Jenkins é uma exceção e o seu "Pedophiles and Priests: Anatomy of a Contemporary Crisis" (Oxford, 214 págs.) é o mais exaustivo estudo sobre os escândalos sexuais que sacudiram a Igreja Católica nos Estados Unidos durante a década de 1990.

Jenkins não nega o óbvio: que existiram vários abusos; e, mais, que as autoridades eclesiásticas falharam na detecção ou denúncia dos mesmos.
Porém, Jenkins é rigoroso ao mostrar como os crimes foram amplificados de forma desproporcionada com o objetivo de cobrir toda a instituição com cores da infâmia.

Padres católicos cometem crimes sexuais? Fato. Mas esses crimes, explica Jenkins, existem em proporção idêntica nas outras denominações religiosas (e não celibatárias). A única diferença é que, sendo o número de padres católicos incomparavelmente superior ao número de pastores de outras igrejas; e estando os crimes de pedofilia disseminados pela população adulta, será inevitável que exista um maior número de casos entre o clérigo católico.

Como explicar, então, que as atenções mediáticas sejam constantemente voltadas para os suspeitos do costume?

Jenkins não é alheio à dimensão "literária" do anticatolicismo ocidental; muito menos à hipersexualização moderna, que vê na doutrina sexual da igreja um anacronismo e, em certos casos, uma ameaça.

Mas o autor vai mais longe e revela como a amplificação dos crimes é, muitas vezes, promovida por facções dissidentes dentro da própria Igreja Católica que esperam assim conseguir certas vitórias "culturais" (o fim do celibato, a ordenação de mulheres para o sacerdócio etc.) pela disseminação de uma imagem de corrupção endêmica. "A maior ameaça à sobrevivência da igreja desde a Reforma", escreve Jenkins, citando as incontáveis reportagens que repetiam essa bovinidade.

Isso significa que os crimes das últimas semanas na Europa podem ser desculpados ou justificados? Pelo contrário: esses crimes não têm desculpa nem justificação. E é de saudar que o papa Bento 16, em atitude inédita, tenha escrito uma carta plena de coragem e dignidade ao clérigo irlandês, condenando os abusadores, pedindo perdão às vítimas e esperando que a justiça faça o seu caminho.

Mas não é apenas a justiça que tem de fazer o seu caminho. O jornalismo preguiçoso também deveria trilhar o seu, separando a histeria anticatólica da verdade criminal.

Um contributo: para ficarmos no país de Ratzinger, existiram na Alemanha, desde 1995, 210 mil denúncias de abusos a menores. Dessas 210 mil, 300 lidaram com padres católicos. Ou seja, menos de 0,2%. Será isso a maior ameaça à sobrevivência da igreja desde a Reforma?

jpcoutinho@folha.com.br

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Em São Paulo, 23 de Março de 2010

Mario Vargas Llosa sobre Lulla

Transcrevo, de O Estado de S. Paulo.

Maria Vargos Llosa, peruano, é, em minha opinião, o maior escritor latino-americano da atualidade. E um dos grandes porta-vozes do liberalismo. Foi candidato a Presidente do Peru contra Alberto Fujimori. Perdeu por pouco – por causa de uma campanha sórdida dos adversários. O tempo mostrou a verdadeira natureza desses adversários, hoje na cadeia. Os peruanos provavelmente lamentam até hoje a sua derrota.

Ele aqui critica Lulla. É uma crítica violenta. Mas totalmente justa e merecida.

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O Estado de S. Paulo – Domingo- 07/03/2010

Mario Vargas Llosa

A decepcionante visita de Lula

Minha capacidade de indignação política atenua-se um pouco nos meses do ano que passo na Europa. Suponho que a razão disso seja o fato de que, lá, vivo em países democráticos nos quais, independentemente dos problemas de que padecem, há uma ampla margem de liberdade para a crítica, e a imprensa, os partidos, as instituições e os indivíduos costumam protestar de maneira íntegra e com estardalhaço quando ocorrem episódios ultrajantes e desprezíveis, principalmente no campo político.

Entretanto, na América Latina, onde costumo passar de três a quatro meses ao ano, esta capacidade de indignação volta sempre, com a fúria da minha juventude, e me faz viver sempre temeroso, alerta, desassossegado, esperando (e perguntando-me de onde virá desta vez) o fato execrável que, provavelmente, passará despercebido para a maioria, ou merecerá o beneplácito ou a indiferença geral.

Na semana passada, experimentei mais uma vez esta sensação de asco e de ira, ao ver o risonho presidente Lula do Brasil abraçando carinhosamente Fidel e Raúl Castro, no mesmo momento em que os esbirros da ditadura cubana perseguiam os dissidentes e os sepultavam nos calabouços para impedir que assistissem ao enterro de Orlando Zapata Tamayo, o pedreiro pacifista da oposição, de 42 anos, pertencente ao Grupo dos 75, que os algozes castristas deixaram morrer de inanição – depois de submetê-lo em vida a confinamento, torturas e condená-lo com pretextos a mais de 30 anos de cárcere – depois de 85 dias de greve de fome.

Qualquer pessoa que não tenha perdido a decência e tenha um mínimo de informação sobre o que acontece em Cuba espera do regime castrista que aja como sempre fez. Há uma absoluta coerência entre a condição de ditadura totalitária de Cuba e uma política terrorista de perseguição a toda forma de dissidência e de crítica, a violação sistemática dos mais elementares direitos humanos, de falsos processos para sepultar os opositores em prisões imundas e submetê-los a vexames até enlouquecê-los, matá-los ou impeli-los ao suicídio. Os irmãos Castro exercem há 51 anos esta política, e somente os idiotas poderiam esperar deles um comportamento diferente.

DESCARAMENTO

Mas de Luiz Inácio Lula da Silva, governante eleito em eleições legítimas, presidente constitucional de um país democrático como o Brasil, seria de esperar, pelo menos, uma atitude um pouco mais digna e coerente com a cultura democrática que teoricamente ele representa, e não o descaramento indecente de exibir-se, risonho e cúmplice, com os assassinos virtuais de um dissidente democrático, legitimando com sua presença e seu proceder a caçada de opositores desencadeada pelo regime no mesmo instante em que ele era fotografado abraçando os algozes de Zapata.

O presidente Lula sabia perfeitamente o que estava fazendo. Antes de viajar para Cuba, 50 dissidentes lhe haviam pedido uma audiência durante sua estadia em Havana para que intercedesse perante as autoridades da ilha pela libertação dos presos políticos martirizados, como Zapata, nos calabouços cubanos. Ele se negou a ambas as coisas. Não os recebeu nem defendeu sua causa em suas duas visitas anteriores à ilha, cujo regime liberticida sempre elogiou sem o menor eufemismo.

Além disso, este comportamento do presidente brasileiro caracterizou todo o seu mandato. Há anos que, em sua política exterior, ele desmente de maneira sistemática sua política interna, na qual respeita as regras do estado de direito, e, em matéria econômica, em vez das receitas marxistas que propunha quando era sindicalista e candidato – dirigismo econômico, estatizações, repúdio dos investimentos estrangeiros, etc. -, promove uma economia de mercado e da livre iniciativa como qualquer estadista social-democrata europeu.

Mas, quando se trata do exterior, o presidente Lula se despe de suas vestimentas democráticas e abraça o comandante Chávez, Evo Morales, o comandante Ortega, ou seja, com a escória da América Latina, e não tem o menor escrúpulo em abrir as portas diplomáticas e econômicas do Brasil aos sátrapas teocráticos integristas do Irã.

O que significa esta duplicidade? Que Lula nunca mudou de verdade? Que é um simples mascarado, capaz de todas as piruetas ideológicas, um político medíocre sem espinha dorsal cívica e moral? Segundo alguns, os desígnios geopolíticos para o Brasil do presidente Lula estão acima de questiúnculas como Cuba, ou a Coreia do Norte, uma das ditaduras onde se cometem as piores violações dos direitos humanos e onde há mais presos políticos. O importante para ele são coisas mais transcendentes como o Porto de Mariel, que o Brasil está financiando com US$ 300 milhões, ou a próxima construção pela Petrobrás de uma fábrica de lubrificantes em Havana. Diante de realizações deste porte, o que poderia importar ao "estadista" brasileiro que um pedreiro cubano qualquer, e ainda por cima negro e pobre, morresse de fome clamando por ninharias como a liberdade? Na verdade, tudo isto significa, infelizmente, que Lula é um típico mandatário "democrático" latino-americano.

Quase todos eles são do mesmo feitio, e quase todos, uns mais, outros menos, embora – quando não têm mais remédio – praticam a democracia no seio dos seus próprios países, mas, no exterior, não têm nenhuma vergonha, como Lula, em cortejar ditadores e demagogos, porque acham, coitados, que desta maneira os tapinhas amistosos lhes proporcionarão uma credencial de "progressistas" que os livrará de greves, revoluções e de campanhas internacionais acusando-os de violar os direitos humanos.

Como lembra o analista peruano Fernando Rospigliosi, em um artigo admirável: "Enquanto Zapata morria lentamente, os presidentes da América Latina – entre eles o algoz cubano – reuniam-se no México para criar uma organização (mais uma!) regional. Nem uma palavra saiu dali para exigir a liberdade ou um melhor tratamento para os mais de 200 presos políticos  cubanos." O único que se atreveu a protestar – um justo entre os fariseus – foi o presidente eleito do Chile, Sebastián Piñera.

De modo que a cara de qualquer um destes chefes de Estado poderia substituir a de Luiz Inácio Lula da Silva, abraçando os irmãos Castro, na foto que me revoltou o estômago ao ver os jornais da manhã. Estas caras não representam a lib
erdade, a limpeza moral, o civismo, a legalidade e a coerência na América Latina. Estes valores estão encarnados em pessoas como Orlando Zapata Tamayo, nas Damas de Branco, Oswaldo Payá, Elizardo Sánchez, a blogueira Yoani Sánchez, e em outros cubanos e cubanas que, sem se deixarem intimidar pelas pressões, as agressões e humilhações cotidianas de que são vítimas, continuam enfrentando a tirania castrista. E se encarnam ainda, em primeiro lugar, nas centenas de prisioneiros políticos e, sobretudo, no jornalista independente Guillermo Fariñas, que, enquanto escrevo este artigo, há oito dias está em greve de fome em Cuba para protestar pela morte de Zapata e exigir a libertação dos presos políticos.

O curioso e terrível paradoxo é que no interior de um dos mais desumanos e cruéis regimes que o continente conheceu se encontrem hoje os mais dignos e respeitáveis políticos da América Latina.

Yoani SanchezYoani Sánchez

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Em São Paulo, 15 de Março de 2010

10 inovações que afetarão o mundo dos negócios

Os onze textos abaixo são retirados da Folha de S. Paulo de hoje (14/3/2010), que, por sua vez, o traduziu do Financial Times. Vale a pena ler.

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201006.htm

DO "FINANCIAL TIMES"

"Financial Times" mapeia tendências de consumo e de gestão diante de um cenário que concilia o pós-crise a novas tecnologias

Daniel Mihailescu – 2.mar.10/France Presse

Visitantes da feira de tecnologia CeBIT, em Hannover, na Alemanha, são retratados em tela que detecta, em tempo real, gênero, idade e humor dos passantes

A CRISE econômica que se alastrou pelo mundo no fim de 2008 e causou transtornos só superados, nos últimos cem anos, pelo crash de 1929 pôs em xeque dogmas de gestão. A obsessão pelo lucro, simbolizada por empresas como o Lehman Brothers, o uso insustentável de recursos naturais, materiais e humanos e mesmo a noção de que é preciso esconder os fracassos de uma companhia mostraram-se técnicas ineficientes, quando não prejudiciais, de administração.

Paralelamente, novos comportamentos, associados a tecnologias inovadoras nas áreas financeira, energética e computacional, sinalizam transformações profundas na maneira de fazer negócios em todo o planeta.

Esses fenômenos, alguns dos quais já perceptíveis, foram mapeados por colunistas e repórteres do diário britânico "Financial Times", que nestas páginas apresentam tendências que devem se disseminar até o final da próxima década.

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201007.htm

1 – Computação em céu aberto: Portáteis serão como supercomputadores

DO "FINANCIAL TIMES"

O assunto quente do setor de tecnologia, nos últimos anos, vem sendo a ascensão da "computação em nuvem". Mas o que exatamente é esse novo desdobramento, e de que maneira influenciará as nossas vidas? São necessárias duas coisas para compreender a plataforma. A primeira se relaciona ao poder de processamento e de armazenagem de dados, que vem se transferindo de máquinas individuais para grandes centrais remotas de processamento de dados.

Isso permite que números sejam processados em escala industrial e que o poderio de um supercomputador seja aplicado a tarefas cotidianas: analisar os padrões de tráfego de uma cidade, por exemplo, e prever onde surgirão congestionamentos.

A segunda parte se relaciona aos bilhões de aparelhos pessoais inteligentes -por exemplo, netbooks e celulares inteligentes- capazes de se conectar a esse recurso centralizado de computação via internet. Isso significa que indivíduos (e não apenas empresas ou governos) poderão tirar vantagem dessas "nuvens" de informações.

Assim, para onde isso nos conduz? Duas previsões gerais surgem rapidamente. Uma é a de que oferecer tanto poder de processamento e armazenagem a baixo custo resultará em novos avanços.

A ciência, por exemplo, poderia ser revolucionada, já que os pesquisadores ganhariam acesso a montanhas inimagináveis de dados e desenvolveriam maneiras de produzir referências cruzadas entre as diferentes disciplinas.

A segunda previsão é a de que os aparelhos pessoais de computação se tornarão superinteligentes, à medida que puderem aproveitar a inteligência da "nuvem". O Google já está falando sobre adicionar tradução de voz instantânea aos recursos de seus celulares. As grandes mudanças que esses avanços da computação representarão podem não estar concluídas ao final da próxima década, mas estarão a caminho.

RICHARD WATERS, chefe da sucursal de San Francisco

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201008.htm 

2 – Trabalhar por mais tempo: Aposentadoria dá lugar à gestão de empresas

DO "FINANCIAL TIMES"

A próxima década verá pessoas mais velhas trabalhando por mais tempo. Não surpreende: além da elevação da idade mínima de aposentadoria pelos governos do Reino Unido e da Grécia, as baixas taxas de juros e a morte das aposentadorias de valor fixo significam que muita gente não terá dinheiro bastante, aos 65 anos, para desfrutar de lazer nos anos de ocaso. Essas pessoas terão de trabalhar para bancar suas contas.

O que considero interessante -e pode mudar o mundo dos negócios- é o fato de que elas talvez prefiram trabalhar por conta própria. Um recente estudo conduzido pela seguradora Standard Life sugeriu que um em cada seis britânicos dos 46 aos 65 anos planeja abrir um negócio novo, em lugar de se aposentar.
Isso representa sete vezes mais potenciais empresários do que na geração precedente -e pode significar o surgimento de milhões de novas empresas no Reino Unido.

A experiência, os contatos e a sabedoria dessas pessoas serão suas armas secretas. Mas é igualmente provável que elas tenham mais tempo e dinheiro a gastar do que a atual geração de empresários. Hoje, a idade típica em que uma pessoa abre sua empresa fica entre os 30 e os 45 anos. Um aspecto inconveniente desse fato é que, nessa idade, as pessoas também costumam ter filhos pequenos e hipotecas a pagar.

Os empresários mais velhos, enquanto isso, estarão em muitos casos próximos de liquidar essas responsabilidades, bem como ávidos por encontrar maneiras de se manter em contato com pessoas de todas as gerações, como clientes, parceiros, fornecedores ou funcionários. Prevejo que muitas companhias importantes serão criadas nos próximos anos. A geração de mais de 50 anos bem pode se tornar a maior responsável por acelerar a recuperação.

LUKE JOHNSON escreve uma coluna sobre empresários e dirige a Risk Capital Partners, uma empresa de capital privado

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201009.htm

3 – A geração X chega ao topo: Após crise, geração
X ganha espaço

DO "FINANCIAL TIMES"

No final dos anos 90, as regras usuais de senioridade no trabalho não pareciam se aplicar aos trabalhadores na casa dos 20 e começo dos 30 anos. O boom da internet transferiu poder a esses jovens -a geração X- e permitiu que seus líderes enriquecessem.

Mas o estouro da bolha da internet expôs a ilusão e forçou os jovens a aceitar papéis subalternos. O fim do castigo, porém, parece estar próximo. Hoje, com 30 ou 40 anos, muitos dos membros da geração X devem chegar ao apogeu de seu poderio profissional até 2020 -e sua falta de ideologia pode ser vantajosa diante dos desafios modernos.

Mas há um novo grupo que já tenta conquistar espaço. Confortáveis no uso de tecnologias digitais, os membros da geração Y não gostam de hierarquias. A crise prejudicou sua ascensão, mas a recuperação pode complicar a retomada da geração X.

ADAM JONES, repórter especial de empresas

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201010.htm 

4 – Energia mais inteligente: Novas tecnologias racionalizam a geração e o uso da eletricidade

DO "FINANCIAL TIMES"

Já estamos vendo algumas das maneiras pelas quais as fontes de energia mudarão nos próximos dez anos. Leitores inteligentes de eletricidade nos EUA, por exemplo, oferecem aos consumidores e às empresas de energia informações detalhadas sobre o seu uso e não só contam com o apoio do presidente Barack Obama como devem substituir os medidores "burros" convencionais.

Isso significa que uma pessoa em breve poderá saber quanta energia está sendo usada em sua casa e quanto dinheiro está sendo gasto, por meio de uma divisão aparelho a aparelho -o que permitirá que a iluminação e o aquecimento sejam ajustados para reduzir custos.

Eletrodomésticos inteligentes, enquanto isso, vão se comunicar com a rede elétrica. Assim, uma secadora de roupas pode se desligar nos horários de pico (e tarifa mais elevada) e ligar de novo quando o preço da eletricidade for mais baixo. As empresas de energia mesmo poderiam interferir ao reduzir um pouco o ar-condicionado no auge da demanda.

Também estamos vendo as vantagens dos diodos emissores de luz (LEDs) como substitutos das velhas lâmpadas incandescentes (e novas fluorescentes, que economizam mais energia). Enquanto as lâmpadas incandescentes geram calor para produzir luz, os LEDs a criam com movimentos de elétrons em chips de silício. A luz é mais natural, pode mudar de cor, pode ser mais precisa e pode ser atenuada ou intensificada sem dificuldade.

A próxima década verá as cidades substituírem sua iluminação pública por LEDs, que duram anos a mais e podem reduzir sua intensidade de forma inteligente quando não houver tráfego, minimizando o uso de energia e a poluição luminosa.

Já que 20% da demanda mundial de eletricidade se relaciona à iluminação, a capacidade dos LEDs para reduzir em 75% o uso de energia pode ter efeito dramático sobre as emissões de dióxido de carbono.

As fontes de energia também podem mudar, especialmente no que tange a aparelhos de pequeno porte. Energia gratuita pode ser capturada de fontes como o calor do corpo ou ondas de rádio de torres de telefonia móvel e Wi-Fi. Girar o controlador para ler um e-mail em um BlackBerry gerará energia suficiente para aumentar a duração da bateria.

CHRIS NUTTALL, correspondente de tecnologia

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201011.htm

5 – A informação tem valor: Dogma do conteúdo gratuito perde força

DO "FINANCIAL TIMES"

Se existe uma ortodoxia dos últimos dez anos que o setor de mídia tem todos os motivos para amaldiçoar é aquela que surgiu em 1984, quando Stewart Brand declarou, em palestra na Hackers" Conference, que "a informação deseja ser livre".

As pessoas ainda discordam sobre o que ele quis dizer, mas a frase oferece uma capa de respeitabilidade intelectual a diversas coisas, da pirataria de música à ideia de que não pagar pelo acesso a notícias é traço imutável da cultura da web.

Quando as pessoas ainda falavam em "via expressa da informação", desdenhavam a ideia de que a estrada proposta precisasse de pedágios. A publicidade on-line supostamente cobriria os custos incorridos pelos donos da informação.

Mas o conteúdo grátis para todos erodiu os modelos de negócios das companhias de mídia e acarreta o risco de sobrecarga das redes de informação. Agora, os proprietários de conteúdo, de editoras de revistas a emissoras de TV imaginam por que teriam depositado toda a sua confiança em uma só fonte de receita, a publicidade.

É hora de relermos a citação completa de Brand: "Por um lado, a informação deseja ser dispendiosa, porque é muito valiosa. Por outro lado, ela deseja ser livre [ou gratuita], porque o custo de obtê-la não para de cair. Por isso, temos essas duas tendências em permanente combate".

Na primeira década digital do novo século, esse combate muitas vezes não aconteceu, mas agora o lema de que "a informação quer ser dispendiosa" vem ganhando força. As editoras pressionaram a Amazon.com a elevar os preços dos livros eletrônicos. A "economia dos aplicativos" criada pela Apple está permitindo que até mesmo sites gratuitos cobrem pelo acesso via iPods e iPads, e o "New York Times" está seguindo o exemplo de publicações especializadas como o "Financial Times" e o "Wall Street Journal" de cobrar pelo acesso on-line às suas notícias.

Para os consumidores que desfrutavam de todo esse conteúdo gratuitamente, isso parece ameaçador. Por outro lado, acabamos de passar uma década nos fartando de conteúdo excessivo e de muito baixo valor nutritivo. Talvez o conteúdo pago se prove mais denso. Quanto à máxima de Brand, é melhor que tentemos uma nova, na próxima década: o conteúdo quer ser valioso.

ANDREW EDGECLIFFE-JOHNSON, editor de mídia nos Estados Unidos

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201012.htm 

6 – Ganhando com o fracasso: Tentativa e erro viram técnica de negócios

DO "FINANCIAL TIMES"

O fracasso sempre foi parte fundamental da economia de mercado. Se os mercados funcionam, fazem-no porque novas ideias são constantemente tentadas. A maioria fracassa. As que encontram o sucesso podem causar o fracasso de ideias mais antigas.

Nos Estados Unidos, cerca de 10% das empresas existentes desaparecem a cada ano. Trata-se de percepção desconfortável -mas tentativa e erro podem enfim estar assumindo o papel que merecem como técnica de negócios, em lugar de serem vistos como um segredinho sujo do capitalismo.

Existem alguns sinais positivos. Stefan Thomke, da escola de administração de empresas da Universidade Harvard, argumenta que os avanços na computação tornaram possível conduzir experiências com novos produtos sem maiores dificuldades, com a tentativa de muitas ideias e a expectativa de grande número de fracassos.

Agora é fácil, por exemplo, experimentar mudanças no layout de um site, mostrando diferentes versões a diferentes usuários e acompanhando as reações em tempo real. O Google, enquanto isso, costuma lançar seus produtos novos com o rótulo "beta", ou experimental. E superastros do mundo acadêmico, tais como Stephen Levitt, o coautor de "Freakonomics", vêm fazendo palestras a executivos sobre o papel da experimentação no mundo dos negócios.

Também estamos começando a aprender mais sobre a psicologia de aprender com os erros. Richard Thaler, o economista comportamental que criou a Nudge, cunhou a frase "edição hedonista" para descrever nosso hábito de combinar pequenas derrotas a grandes vitórias, a fim de mascarar as dores das derrotas.

Esconder os fracassos é humano, mas também significa não aprender com eles. Thaler e seus colegas chegaram a estudar o comportamento dos participantes em game shows televisivos. Ele constatou que as pessoas que faziam escolhas desafortunadas começavam a aceitar riscos insensatos, o que muitas vezes resultava em agravar perdas.

A crise nos conscientizou de que um sistema incapaz de tolerar certa dose de fracasso é muito perigoso. A ideia de que uma instituição fosse "grande demais para falir" costumava parecer reconfortante. Não é mais esse o caso.

TIM HARFORD, colunista e autor do livro "Undercover Economist"

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201013.htm

7 – A cobiça não é tão boa: Obsessão pelo lucro pode quebrar empresas

DO "FINANCIAL TIMES"

Nos anos 80, o economista Al Rapaport capturou o espírito da era ao desenvolver um novo objetivo para as empresas: a maximização de valor para os acionistas. A medida das realizações de um executivo seria o retorno total conquistado pelos acionistas em seu mandato.

Bill Allen, o lendário líder da Boeing entre 1945 e 1968, descreveu o espírito de sua companhia assim: "Beber, respirar e dormir o mundo da aeronáutica". Por volta de 1998, o novo presidente da companhia, Phil Condit, dizia: "Vamos avançar para um ambiente cuja base é o valor e no qual o custo unitário, o retorno sobre o investimento e os retornos dos acionistas serão as medidas sob as quais seremos avaliados".

Isso aconteceu em múltiplos setores. Quando John Reed e Sandy Weill, que eram copresidentes do Citigroup no final dos anos 90, descreveram os propósitos do conglomerado recém-criado, Reed, banqueiro tradicionalista, declarou que "o modelo que tenho em mente é o de uma companhia global de serviços ao consumidor, que ajude a classe média com algo em que não foi bem servida". Weill, mais sintonizado no espírito do tempo, interrompeu: "Meu objetivo é aumentar o valor para os acionistas". Tudo isso terminaria mal.

Sob Allen, a Boeing conquistou a liderança do setor aeronáutico; sob Condit, a empresa não só perdeu sua liderança como se envolveu em escândalos.

Weill forçou a saída de Reed, mas se envolveu em problemas de reputação que abalaram a empresa. Em 2008, quase todo o valor do Citigroup para os acionistas foi destruído.

A Enron, paradigma do novo modelo, quebrou de forma espetacular em 2001. Em 2008, o colapso do Lehman Brothers, banco cujo foco obsessivo era o lucro, quase derrubou o sistema financeiro mundial. Essas duas quebras abriram e encerrarão a década com uma lição: concentração obsessiva nos lucros faz com que uma empresa corra o risco de perder a oportunidade de lucrar.

JOHN KAY, colunista

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201014.htm

8 – Livrai-nos das contas: Internet agora muda a forma de lojas físicas

DO "FINANCIAL TIMES"

Da mesma forma que a chegada das prateleiras que permitiam self-service mudou a disposição física das lojas nos cem últimos anos, as compras on-line o farão no novo século. Já vimos o comércio via internet se tornar concorrente sério das lojas físicas. Agora ele fará com que mudem de forma. No Walmart, por exemplo, mais de 40% dos pedidos pelo site da cadeia de varejo nos EUA são enviados a uma loja local da rede para retirada, porque os clientes preferem evitar os custos e a incerteza de horários das entregas domiciliares.

A empresa, como resposta, está testando opções "drive-through" de retirada e alterando suas unidades de forma a instalar balcões de retirada. No Reino Unido, a rede de supermercados Tesco adotou arranjo semelhante (mas por enquanto sem "drive-through").

Em uma loja piloto perto de Chicago, chamada MyGofer, a Sears Holdings foi além, e 80% do espaço serve como armazém de estoque, com um quinto da área reservada a clientes que retiram compras ou usam terminais de computador para pedir o que desejam da loja.

Eis outra variante: o Kmart também está tentando persuadir outras redes de varejo a usar suas lojas como ponto central para retirada de pedidos feitos on-line. Alguns analistas do setor de varejo especulam que até mesmo a Amazon, que só opera on-line, poderia um dia estabelecer pontos de retirada.

A web também mudará os produtos presentes nas prateleiras. Um cliente que vá a uma loja com seu celular inteligente pode obter preços comparativos de lojas rivais -a menos que o produto em questão só esteja à venda naquela loja específica.

Assim, haverá mais pressão da parte do varejo por acordos seletivos com marcas líderes -ou pelo desenvolvimento de mais produtos com marca própria, em todas as categorias.

JONATHAN BIRCHAIL, correspondente de varejo nos Estados Unidos

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201015.htm

9 – Fazer mais com menos: Concorrência força ganho de eficiência

DO "FINANCIAL TIMES"

O triunfo inevitável dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) se tornou quase um lugar-comum no mundo empresarial. Mesmo que alguns ovos exóticos estejam sendo contados antes que sejam chocados, a ameaça que representam está mudando o modo como as empresas pensam.

Com a concorrência, as empresas hoje dominantes terão de ser mais eficientes. É por isso que, ao longo dos próximos anos, será comum ouvir variações do seguinte lema: fazer mais com menos. Outro fator de estímulo será a sustentabilidade ambiental: produzir mais usando menos recursos.

Mas uma demanda permanente para que produzamos mais com menos pode se revelar prejudicial e resultar em um mundo de trabalho permanente, que por sua vez poderia afetar a qualidade do trabalho realizado. O ímpeto de fazer mais pode conter as sementes de sua própria derrota.

STEFAN STERN, repórter de gestão

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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1403201016.htm

10 – O hedge, agora pessoal: Temidas, inovações financeiras podem estimular o crescimento

DO "FINANCIAL TIMES"

Inovação financeira se tornou uma expressão obscena nos últimos meses, devido ao papel dos títulos complexos -pacotes de hipotecas e outras formas de passivo- na crise. Mas o segredo sujo é que, se as economias ocidentais desejam se recuperar devidamente, as verbas terão de vir dos mercados. E a concorrência por dinheiro será tamanha que alguns projetos devem se ver forçados a criar inovações a fim de atrair investidores.

Uma dessas inovações é a transferência de risco. Transação que vinha ganhando popularidade antes da crise, ela agora está de volta. Robert Schiller, professor de economia na Universidade Yale, publicou em 2003 um livro no qual propunha novos instrumentos financeiros para indivíduos que permitiriam que se protegessem contra os riscos que correm -fizessem hedge- por contratos negociados em Bolsa. Se você, por exemplo, estiver preocupado com a possibilidade de que a carreira que escolheu não vá oferecer o salário que planeja ter dentro de dez anos, poderia criar um contrato sob o qual receberia certa quantia caso sua renda naquela data for inferior a determinado patamar.

Os investidores se interessarão em apostar nesse tipo de coisa, diz Schiller. De fato, mercados como esses estão sendo criados para grandes organizações. Há, por exemplo, o mercado futuro das nevascas, sob o qual cidades ou empresas recebem dinheiro caso as tempestades de neve sejam piores que o esperado. No mês passado, um grupo de bancos, fundos de pensão e seguradoras anunciou que estava desenvolvendo um novo mercado para longevidade -o risco de que as pessoas vivam mais que o esperado.

Será que essa ideia não parece terrível, tendo em vista a situação em que os contratos de risco deixaram os bancos no passado recente? Schiller argumenta que a crise de crédito simplesmente demonstra que "muito mais trabalho precisa ser feito para democratizar as finanças. A crise ocorreu porque os princípios de gestão de risco financeiro não estavam sendo aplicados à mais ampla população possível".

Ou seja, o risco é para todos: empresas, governos e cidadãos agora podem rolar os dados nesse negócio arriscado.

JENNIFER HUGHES, correspondente sênior de mercados

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Em Salto, 14 de Março de 2010