Eu chego lá… (ou a ciência finalmente chega a mim)

Tive um infarto em Março de 2002 – e me vi forçado a mudar minha dieta. Aos poucos, porém, liberalizei-a um pouco: os remédios ajudam a manter o colasterol sob controle. Mesmo assim, não é fácil.

Mas tinha dois grandes consolos.

Primeiro, eu podia tomar vinho tinto, o meu favorito. Quem dizia que vinho tinto era bom para o coração sempre aconselhava a tomar uma taça por dia. Perguntei ao meu cardiologista se haveria problemas em tomar um pouco mais do que isso. Ele me respondeu que o problema mais grave que poderia ocorrer seria eu me tornar alcóolatra. E me advertiu que vinho tinto tem calorias – e que, portanto, não deveria me esquecer de que muito vinho pode dificultar o controle do peso. Resolvi enfrentar os dois riscos – e tenho me dado bem. Não fiquei alcoólatra (por enquanto) e estou com o peso razoavelmente sob controle.

Segundo consolo: salmão, que é meu peixe favorito (quando grelhado, com alcaparras), também é bom para o coração. Sempre que vou a um bom restaurante, peço salmão – especialmente quando estou em Seattle ou em Santiago, em ambos os casos cidades em que se vendem excelentes salmões em não menos excelentes restaurantes.

Hoje vi uma reportagem no Jornal Nacional informando o resultado de pesquisas que provam que chocolate do tipo escuro (amargo) também é bom para o coração. Excelente. Mais uma coisa de que gosto que é boa para o coração. Um terceiro consolo.

Estou esperando que a ciência prove que pão francês, salame italiano e presunto de Parma são bons para o coração. Daí não preciso mais me preocupar com alimentação:

No almoço, salmão ao molho de alcaparras, acompanhado de pão francês e de  vinho tinto, com chocolate amargo de sobremesa;

À tarde, um lanche de pão francês com presunto italiano e/ou presunto do tipo Parma, acompanhado de vinho tinto, com chocolate amargo de sobremesa.

A ciência ainda chegará até mim. Só falta algum bom cientista provar que, entre as refeições, umas colheradas de Leite Condensado fazem bem ao coração. Daí o mundo será dos cardíacos.

(Andar, de que também gosto, a ciência já provou que faz bem para o coração. Sexo a ciência já provou que faz bem ao coração. Antigamente se dizia que tudo que é gostoso ou faz mal para a saúde, ou engorda, ou é pecado. Do jeito que as coisas estão caminhando, um dia se provará que tudo o que é gostoso faz bem para o coração.)

Em Campinas, 28 de Agosto de 2008

Hotéis japoneses e a tecnologia de higienização pessoal

Eu juro que eu havia prometido a mim mesmo não escrever sobre isso, mas não resisto — embora, tenho certeza, alguns de meus leitores possam julgar o assunto de gosto duvidoso, quando não de profundo mau-gosto. Trata-se das privadas dos hotéis japoneses — em especial a do Four Seasons em que estou hospedado e que, portanto, conheço de primeira mão (mão?).

O banheiro é dividido em três  saletinhas: uma tem a pia, outra tem o chuveiro e a banheira, e a última tem o vaso sanitário. Quando entrei nessa última, levei um susto: o vaso sanitário era de uma complexidade inacreditável, cheio de caninhos e fios, e, ao lado, com um painel complicado, cheio de botões. O painel contém texto em Japonês, mas tem uns iconezinhos que são uma gracinha (Hebe: desculpe o plágio!). Na parede, ao lado, há uma explicação em Inglês sobre o uso do painel e de toda a aparelhagem. (E há um aviso: apesar de este vaso sanitário ter inúmeras funções automatizadas, a descarga não é automática: por favor aperta a alavanca à esquerda depois de usar). 

Em primeiro lugar, há uma advertência: não tente operar o painel sem estar sentado no vaso sanitário. Creio que a razão é evidente: você pode levar um banho.

Em segundo lugar, há um aviso: o assento é aquecido, mas a temperatura é suave ("gentle") — e, portanto não há risco de a gente queimar a bunda. (Já que decidi escrever sobre o assunto, não vou ficar falando em nádegas, região glútea, etc., porque isso é absoluta frescuragem a que nem mesmo a fresca Folha de S. Paulo recorre mais).

Em terceiro lugar, e muito sabiamente, o primeiro botão é "Cancel/Stop" — ele cancela ou interrompe a operação de qualquer um dos outros três botões. Assim, se algo der errado, a solução está ali à mão, logo no primeiro botão.

Finalmente — acredito que fiz suspense suficiente — aqui vai uma breve descrição da operação dos demais botões (do segundo ao quarto).

O segundo botão lança um jato de água morna e relativamente forte bem na direção da parte do corpo usada, tanto por homens como por mulheres, para o que a criativa gíria brasileira chama de "Número Dois". (Tudo bom, gente, eu poderia ser mais explícito, mas até eu tenho cá meus limites). O jato de água (le jet d’eau, como diriam os franceses) continua até que você aperte o botão número um. (Aqui entre nós, o iconezinho que ilustra esse botão, o segundo, é bem descritivo: é uma bundinha bonitinha (mas estilizada) se equilibrando em cima de algo parecido com um mini-chafariz. Os mais chegados ao bom-tom que me desculpem, mas tirei até uma foto do iconezinho, tão gracioso ele é.)

O terceiro botão faz mais ou menos a mesma coisa, mas com um jato de água mais suave ("gentle") — sempre aquecido. Creio que sirva para enxaguar. (A privada não tem um quadrinho com FAQs).

O interessante é o quarto e último botão — que tem o nome de "Bidet". Quando você o aperta, vem um novo jato de água forte e morno, mas agora numa direção diferente, um pouco mais para a frente. Concluí que a maior parte dos homens dificilmente vai usar esse botão, a menos que deseje massagear a próstata… O iconezinho desse botão também é gracioso: é uma mulherzinha flutuando em cima do chafarizinho. Sabe-se que é uma mulherzinha porque o cabelo é comprido, preso num rabinho-de-cavalo: a mulherzinha do ícone, como boa parte das mulheres japonesas, nao tem quase nenhum seio.

Bom, acho que consegui descrever essa importante tecnologia de higiene pessoal sem descambar para a grosseria ou o mau-gosto. Pelo menos, espero.

Como diria o outro, só japonês mesmo para inventar uma coisa dessas…

[Em tempo 1: Escolhi, como Categoria para esse artigo, "Health and Wellness". Pareceu-me a categoria mais próxima…]

[Em tempo 2: Se a casa da Lisa Belkin, que escreveu o artigo que transcrevi na matéria anterior, tivesse essa importante tecnologia japonesa, ela não precisaria ter roubado o rolo de papel higiênico de sua empresa, roubo que, pelo jeito, a deixou tão traumatizada que, no artigo, prometeu nunca mais fazer isso…]

[Em tempo 3: Meu amigo Julio de Angelis descobriu o site dessa importante tecnologia: http://www.washlet.com. Os modelos exibidos lá são ainda mais sofisticados. E o site é um barato: não deixem de ver/ouvir os depoimentos!]

Em Tokyo, 4 de Setembro de 2007